sábado, 10 de setembro de 2011

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato
O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço
O amor comeu meus cartões de visita
O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera o meu nome
O amor comeu minhas roupas, meus lenços e minhas camisas
O amor comeu metros e metros de gravatas
O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meu sapato, o tamanho de meus chapéus
O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos
O amor comeu minha paz e minha guerra,
meu dia e minha noite,
meu inverno e meu verão
Comeu meu silêncio,
minha dor de cabeça,
meu medo da morte.
Do João Cabral de Melo Neto
citado pelo Cordel do fogo encantado

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